Ubasute e a cultura do abandono de idosos no Japão

Já ouviu falar em ubasute? Nos últimos anos portais e editoriais do mundo inteiro voltaram seus olhos para a questão da cultura do abandono de idosos no Japão e seu possível retorno.

Apesar de não ser exatamente uma tradição, o ubasute que pode ser traduzido como “abandonar um idoso” está mais presente em obras literárias do país, como poemas e koans, do que como comportamento social.

Fato é, que esse fenômeno já foi uma prática em alguns períodos da história japonesa. Principalmente em épocas de escassez de alimentos e recursos básicos.

O que é exatamente o ubasute?

Ubasute

O ubasute é uma prática onde os familiares mais jovens levam seus parentes idosos para um local isolado e os abandonam para morrer. Normalmente em florestas e ambientes naturais.

Porém, ainda que a tradução de ubasute seja “abandonar um idoso”, o que caracteriza o ato como senicídio, também se estende para pessoas com alguma deficiência ou problemas mentais e psicológicos.

Ubasute: um fardo e uma decisão

Ubasute

Por mais sombrio e desumano que um ato desse possa parecer, as circunstâncias que levam uma pessoa a tomar essa atitude geralmente é extrema.

Quem nasceu a partir da segunda metade do século XX está habituado com um mundo de abundância onde qualquer um pode encontrar o que quiser para comer ou consumir em um supermercado próximo.

Porém, antes das revoluções industriais, o ser humano dependia única e exclusivamente dos caprichos da natureza e seus ciclos.

Portanto, em períodos que a natureza castigava as plantações e os animais, as pessoas sofriam longos períodos de privações e incertezas.

Além disso, movidas pelo desespero as famílias menos favorecidas precisavam tomar uma decisão para sua própria sobrevivência.

Vida em clãs

Se considerar o Japão tradicional, as famílias sempre viviam juntas na mesma casa ou no mesmo ambiente. Um cuidava e dependia do outro, esse era o conceito de clã.

Oyasute

Então, abandonar um parente, especialmente um idoso, era extremamente doloroso a nível pessoal. Quando os próprios filhos que abandonavam seus pais (oyasute), também era doloroso a nível social.

Idosos decidiam também

Ubasute

Vale lembrar que nem sempre a decisão de abandonar um idoso partia dos mais jovens. Conscientes de que se tornaram um fardo e da necessidade de suas famílias, os próprios idosos convenciam seus familiares a abandoná-los.

Kamurikiyama

Existem diversos poemas, koans e lendas a respeito do tema. Em Chikuma, na prefeitura de Nagano, existe uma montanha chamada Kamurikiyama.

Ela é conhecida também como Obasuteyama por ser um local de abandono de idosos em outras épocas do Japão.

Além disso, essa montanha e suas lendas serviram como base para muitos filmes e animes no Japão. O mais conhecido e mais notável entre eles foi uma animação chamada Obasuteyama de 1925 e dirigida por Sanae Yamamoto.

Para assistir a animação, confira abaixo:

O retorno do ubasute?

Com o envelhecimento da população japonesa, a globalização, políticas neoliberais, ocidentalização do Japão e um profundo déficit em casa para terceira idade e cuidadores de idosos, há uma preocupação das autoridades japonesas em relação ao retorno do ubasute.

Afinal, a carga de trabalho dos japoneses é uma das mais altas do mundo e os índices de karoshi também são. Além disso, o custo de vida no Japão é um dos maiores do globo.

Então, com pouco tempo e dinheiro, até porque um cuidador de idosos no Japão é caríssimo dado a falta de profissionais, muitos idosos estão a mercê de sua própria sorte.

Solidão

Idosa sozinha no Japão

A maioria dos cidadãos japoneses sêniores passam a maior parte de seus dias sozinhos dentro de suas casas. Normalmente não conseguem sequer conversar com um parente após um dia de trabalho devido ao cansaço.

Ainda que exista um convênio do governo japonês com hospitais para reservar alguns leitos para idosos, é considerada uma morte tão fria quanto um abandono nas montanhas remotas do país.

Ritsuko Tanaka

Alguns casos no Japão como o de Ritsuko Tanaka em 2011, que foi preso por abandonar o pai que sofria de Alzheimer, soaram o alarme das autoridades japonesas e de especialistas de todo o mundo.

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Katsuo Kurozawa

Outro caso que ficou conhecido no país só veio a tona em 2015. Katsuo Kurokawa de 63 anos abandonou sua irmã nas montanhas de Chiba após o terremoto seguido de tsunami em 2011.

Mesmo que a prática ainda não tenha se tornado uma “epidemia” nacional, o problema pode retornar ou já existir de uma maneira diferente. Há também os que morrem dentro de suas casas e a morte só é descoberta depois de dias.

De uma forma, o ubasute e a cultura do abandono são um espectro que ronda a sociedade japonesa nos tempos modernos, seja pelo abandono na selva natural ou na selva de pedras.

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